sexta-feira, 23 de março de 2018

(Análise) Vulgo Grace: a voz das mulheres marginalizadas




Se podemos resumir este livro em uma só palavra, seria “triste”, pois é difícil não se comover e não se indignar com a vida difícil e sofrida da protagonista e todas as personagens femininas deste romance, retratado no Século XIX, mas com diálogos tão recentes.

Baseado em fatos reais, Vulgo Grace dá voz a história de Grace Marks, uma mulher que anteriormente foi acusada e julgada como assassina, todavia não foi executada, mas cumpria prisão perpétua. Depois de anos reclusa, Grace consegue voz através do Dr. Simon Jordan, um médico que tinha a intenção de usá-la como instrumento de pesquisa para um novo tratamento psiquiátrico, por muitos, Grace era considerada louca e a história dela tornou-se interessante para seu sucesso.

Então, temos a narrativa de Grace sobre todos os acontecimentos que antecederam o assassinado de Nancy Montgomery e Sir. Kinnear, Grace os descreve minuciosamente, porém o momento em questão é visto como apagado em sua memória. Grace desde nova possuiu uma vida repleta de mazelas, imigrante da Irlanda, perde sua mãe durante a vinda ao Canadá, começa sua rotina como criada aos treze anos, vivendo em uma família miserável. Grace tem lampejos de alegria ao conhecer Mary Whitney, sua companheira de trabalho, todavia o final de Mary é tão trágico quanto a vida que Grace levava e deprimida, Grace vai trabalhar na casa do Sir. Kinnear cujo tinha Nancy Montgomery como sua governanta.

Ao decorrer da história, a narrativa vai oferecendo momentos de questionamento quanto a sanidade de Grace, tendo ela uma personalidade muito áspera, não é possível saber se realmente ela era louca, sedutora ou assassina e a intensidade dos fatos chegam a chocar não apenas o leitor, mas também seu ouvinte, Dr. Jordan que se vê envolvido cada vez mais pela história que o próprio expos de forma tão invasiva, por momentos é perceptível que ele se envolveu de uma forma tão grande que chegava a ter certo interesse sexual pela prisioneira. Consegui entender a loucura de Jordan, uma vez que os fatos narrados por Grace são perturbadores e sofridos, muitas vezes tive que parar a leitura pois sentia muita pena não apenas dela, mas por todas as mulheres daquela história.

Era nesse ponto que eu queria chegar, o sofrimento daquelas mulheres. Margaret Atwood tece um trabalho fantástico e crítico sobre a posição daquelas mulheres na época, um debate que pode ser levado para os dias atuais tranquilamente. A autora aborda questões como a marginalização da figura feminina e também critica valores da época que punham mulheres em rivalidade umas com as outras e o que isto lhes causavam. Devemos destacar três mulheres desta história: Grace Marks, Mary Whitney e Nancy Montgomery, as vejo quase como uma única personagem, uma alegoria ao sofrimento das mulheres, que tiveram suas vidas banalizadas de inúmeras formas. De todas, (na verdade quase todos os personagens não tiveram finais felizes), Grace foi a única que teve uma redenção e cumpriu de nunca esquecer da memória das mulheres que passaram por sua vida e tiveram fins trágicos, de certa forma, ela se via ligada a elas.

Mais uma vez, Margaret Atwood me surpreendeu com sua escrita crítica e contemporânea, estou me convencendo que ela atualmente é minha autora favorita, talvez porque ela aborda temas que eu procuro em minhas leituras e Vulgo Grace não me decepcionou, eu já havia visto a minissérie do Netflix e agora lendo o romance, me vejo tão encantada quanto. Será o livro e a autora cujo sempre indicarei!



Com carinho, Malu, a Traça dos Livros.

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