“A decisão era deixar o mundo
melhor do que ela o havia encontrado...” (Pág. 337)
Eu cheguei à conclusão de que não
irei descansar até ler a obra completa de Virginia Woolf e dessa vez, escolhi
ler seus contos. A reunião de cinquenta contos produzidos durante todo o período
de criação literária da autora, é complicado falar sobre um livro com tanto
conteúdo uma vez que os contos são diversos, mas posso dizer que se existe algo
que pode descrever a produção contista de Virginia Woolf é a preparação.
Digo preparação pois conseguimos
captar todos os artifícios presentes em sua obra de forma experimental e também
como forma de maturação, conseguimos perceber o progresso da autora em relação à
forma, como ela vai aprimorando seu estilo ao passar do tempo e também como
certos enredos começaram a ser construídos. Se você ler cada um na sequência, também
irá perceber que alguns contos conversam entre si, um personagem de um conto x
está presente também no conto y, ou o cenário é sugestivo para um próximo conto,
como por exemplo, Kew Gardens é citado em vários contos até ganhar um conto em
especial. Eu realmente não sei se a autora tinha alguma intenção com isso, mas
quero acreditar que em cada conto ela deixava pistas para os próximos que
viriam.
Não posso deixar de mencionar que
nossa querida Mrs. Dalloway aparece como personagem já em contos da Virginia
Woolf. Sua primeira aparição é no conto “Mrs. Dalloway em Bond Street” e temos
como primeira frase deste conto algo muito familiar: “Mrs. Dalloway disse que
ela mesma ia comprar as luvas. ” Soa familiar para vocês? Porque para mim, é um
tanto quanto, mais uma vez friso na preparação, nesse conto temos uma
personagem, um enredo e um estilo sendo criados antes no romance que consagrou
a escritora. Mrs. Dalloway pareceu me outros contos também, em especial no
conto “A Apresentação” que eu não podia deixar de citar, pois foi o meu
primeiro contato com a obra da Virginia, a um ano atrás, na aula de Teoria do
Texto Narrativo, posso dizer que este conto é bem especial e particular para
mim, pois é minha introdução ao mundo literário de Virginia Woolf, daquele dia
em diante eu estaria lendo e mais lendo suas obras.
Agora vou deixar reservado este
momento para comentar de dois contos que eu adorei muito! Talvez eles sejam os
meus favoritos. O primeiro se chama “ Uma sociedade”, nesse um grupo de
mulheres se reúnem e discutem sobre a sociedade que vivem, são mulheres
instruídas e com grandes ideias, mas percebem que nunca serão realmente ouvidas
na sociedade, temos ali um grande tom de ironia ao falar de temas como a
literatura ou o casamento, no final, temos o anúncio da Guerra após o seu
término, temos o reencontro destas mulheres depois de tantos anos tentando
refletir sobre o que a sociedade se tornou depois da Guerra e o que poderia ser
feito para o futuro. Achei esse conto de uma reflexão tremenda sobre a relação
da sociedade e a mulher, tal reflexão que se torna atemporal, já que você consegue
ter o mesmo questionamento anos depois que o conto foi publicado.
O outro conto que me cativou muito
foi o “Lapin e Lapinova”, a história de um casal recém-casado que ao se
conhecerem após o matrimonio, Rosalind percebe um gesto diferente em seu
marido, seu nariz tremia feito uma lebre e daquele dia em diante, o espírito do
casal se transformou em duas lebres em uma floresta apenas deles, Lapin e
Lapinova, uma união particular e única deles, o espírito do casamento daquele
casal. Passou os anos e um dia Rosalind sente que algo está diferente e
inquieto dentro de si, foi naquele momento que ela percebeu que a alma de sua
lebre Lapinova se foi e nada mais poderia ser feito. Uma alegoria sobre as relações
de amor que são únicas e que um dia podem simplesmente... acabar. Me tocou
muito a delicadeza de tudo que passou no conto, no final me via emocionada.
“ ‘É Lapinova...’, balbuciou ela,
fitando-o tumultuosamente com seus grandes olhos sobressaltados. ‘Ela se foi,
Ernest. Eu a perdi! ’ (...) E esse foi o fim daquele casamento. ” (Pág. 390)
Voltando a falar da forma, não
podia deixar de falar sobre o fluxo de consciência, se for falar de Virginia
Woolf e não citar este artificio muito bem usado pela autora, seria melhor eu
me retirar. Com maestria a autora consegue desenvolver profundos momentos de
fluxo de consciência em seus contos, deixo em especial o conto “A marca na
parede” que a partir de um dia que uma marca na parede foi vista, inúmeras reflexões
são costuradas ao decorrer da narrativa e a marca na parede foi apenas um
estopim para aquela história se desenvolver. Ao correr da leitura, vemos como
esta técnica foi se aprimorando com o passar do tempo e vestígios dos que
seriam os romances publicados da autora já apareciam, como por exemplo o
romance “As Ondas” em muitos contos consegui perceber características semelhantes.
Mais uma vez caímos na preparação.
Preparação, ao escrever sobre isso
me recordei sobre a minha última aula de Consolidação da Literatura Brasileira,
estudamos o projeto literário de Machado de Assis e podemos notar que até ele
publicar o seu primeiro romance, Machado de Assis passou por uma preparação a
partir de seus poemas, contos, crônicas, ensaios até publicar Ressurreição e
seus outros romances, houve um processo de reflexão e maturação que o fez ser o
que até hoje estudamos. Quero crer que o mesmo houve com Virginia Woolf, um
processo de aprimoramento e preparação para o que iria vir, seus romances que
até hoje são clássicos da literatura. Agora saindo (não completamente) do
universo da literatura, para criar um projeto de vida é necessário tempo e reflexão,
do mesmo jeito que meu professor citou em sala de aula, é necessária uma
preparação para aquilo que ainda virá, quando penso que tinha um sonho de ser
escritora, como isso foi ingênuo, mas ao mesmo tempo pretencioso. Tenho dezenove
anos, muito tempo ainda me aguarda e muitas reflexões, imagino que estou no
caminho, mas ainda muito no começo e quando penso em escrever não me sinto
digna o suficiente, parece que me falta algo ao escrever, me falta tempo, me
falta amadurecimento, mas estou me preparando para o futuro que me aguarda. Talvez
este blog seja minha preparação do meu projeto de vida, quem sabe? Quem sabe no
futuro eu não veja este blog com um novo olhar, um olhar maduro e se isso
acontecer eu já quero deixar um recadinho para o meu eu do futuro.
“Hey, Malu do futuro, hoje você é
apenas um processo, mas tenha muito orgulho da sua jornada, a única coisa que
precisa ser é você mesma, da sua maneira, sinta orgulho disso sempre, saiba que
para mim você é muito especial e seu projeto será ótimo a sua maneira, tenha
orgulho disso. ”
“Depois que ela aprender a ler,
somente numa coisa você poderá ensiná-la a acreditar, nela mesma” (Pág. 182)
Com carinho, Malu, a Traça dos
Livros.
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